Responsabilidade civil dos bancos pelos prejuízos causados em negócios jurídicos de mútuo

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26/10/2018 às 09:09
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III – A NULIDADE DO REGISTRO PÚBLICO E A BOA-FÉ

Enquanto não declarados nulos os registros das escrituras públicas antecedentes, a propriedade dos imóveis era válida, não competindo à recorrente [instituição financeira] negar fé a ato público, aparentemente legítimo e revestido das formalidades legais. Afastar a presunção de validade dos atos, somente posteriormente anulados, era ato que competia ao Poder Judiciário, imbuído do poder geral de cautela ou mediante provocação por meio de requerimento de antecipação dos efeitos da tutela”, disse o ministro.

Dessa forma, segundo o relator, é impossível responsabilizar o banco, pois apenas exerceu o direito de conceder financiamento a terceiros que comprovaram as condições para a contratação.

O ministro Marco Aurélio Bellizze afirmou que a responsabilização exigiria também que se verificasse a existência de nexo causal entre o dano e o suposto ato ilícito praticado pelo banco. No entanto, insistiu o ministro, não ocorreu ato ilícito por parte da instituição financeira.

Com efeito, a responsabilização civil solidária, tal qual as obrigações solidárias, não se presumem, sendo imprescindível que se demonstre a existência de convenção ou de causa legal (art. 265 do CC/2002 e 896 do CC/1916). Entre as causas legais que impõem a responsabilidade civil é certo que o Código Civil estabelece a solidariedade entre coautores da conduta danosa, situação que já era reconhecida desde o Código Civil de 1916, vigente à época dos fatos sub judice (art. 1.518 do CC/1916 e 942 do CC/2002). Art. 1.518. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outros ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se tiver mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação. Parágrafo único. São solidariamente responsáveis como autores os cúmplices e as pessoas designadas do artigo 1.521.

Com efeito, a responsabilização civil solidária, tal qual as obrigações solidárias, não se presumem, sendo imprescindível que se demonstre a existência de convenção ou de causa legal (art. 265 do CC/2002 e 896 do CC/1916). Entre as causas legais que impõem a responsabilidade civil é certo que o Código Civil estabelece a solidariedade entre coautores da conduta danosa, situação que já era reconhecida desde o Código Civil de 1916, vigente à época dos fatos sub judice (art. 1.518 do CC/1916 e 942 do CC/2002). Art. 1.518. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outros ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se tiver mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação. Parágrafo único. São solidariamente responsáveis como autores os cúmplices e as pessoas designadas do artigo 1.521.

Bem ilustre o voto vencedor naquele julgado citado:

“O reconhecimento jurídico de que a sociedade moderna é uma sociedade de riscos impôs aos civilistas o avanço da compreensão inicial de imputação vinculada à autoria de uma conduta censurável – ato ilícito –, como fundamento para imposição do dever de retribuição, para uma imputação decorrente do reconhecimento de violação a um dever geral de precaução. A inobservância de um dever difuso de solidariedade, que impõe a todos uma atuação consciente dos riscos decorrentes de seus atos e sempre tendente a minimizá-los, passa a ser fundamento de responsabilização por danos percebidos por terceiros (ROSENVALD, Nelson. As funções da responsabilidade civil: a reparação e a pena civil. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 30). Contudo, a objetivização da responsabilidade civil, mesmo em dias atuais, ainda que se afaste da mera imputação de atos ilícitos, não pode alcançar tamanha abstração, de modo a se desconectar, de forma absoluta, da relação causal estabelecida entre a conduta e o dano, impondo quase que um dever geral de obstar a ocorrência de toda e qualquer fatalidade numa sociedade eminentemente de risco. Nesse sentido, alerta Nelson Rosenvald "se a vitimização é aleatória, sua origem também tende a se tornar aleatória, em virtude do cálculo de probabilidade que situa todas as ocorrências sob o signo do acaso. Tudo se torna fatalidade, que é o exato oposto da responsabilidade. Fatalidade é ninguém; responsabilidade é alguém" (op. cit., p. 31). Na mesma trilha, o entendimento desta Terceira Turma reconhece a necessidade de se buscar uma justificação jurídica para se imputar a responsabilidade civil àquele que não se encontra atrelado ao dano por uma perspectiva tradicionalmente causal (REsp n. 1.606.360/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 30/10/2017). Essa transmudação da imputação meramente causal em normativa se encontra incorporada ao nosso ordenamento jurídico por meio do Código de Defesa do Consumidor (arts. 12 e 14), bem como dos casos legais de aplicação da teoria do risco-proveito estabelecida genericamente no parágrafo único do art. 927 do CC/2002 ("Parágrafo único.

O reconhecimento jurídico de que a sociedade moderna é uma sociedade de riscos impôs aos civilistas o avanço da compreensão inicial de imputação vinculada à autoria de uma conduta censurável – ato ilícito –, como fundamento para imposição do dever de retribuição, para uma imputação decorrente do reconhecimento de violação a um dever geral de precaução. A inobservância de um dever difuso de solidariedade, que impõe a todos uma atuação consciente dos riscos decorrentes de seus atos e sempre tendente a minimizá-los, passa a ser fundamento de responsabilização por danos percebidos por terceiros (ROSENVALD, Nelson. As funções da responsabilidade civil: a reparação e a pena civil. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 30). Contudo, a objetivização da responsabilidade civil, mesmo em dias atuais, ainda que se afaste da mera imputação de atos ilícitos, não pode alcançar tamanha abstração, de modo a se desconectar, de forma absoluta, da relação causal estabelecida entre a conduta e o dano, impondo quase que um dever geral de obstar a ocorrência de toda e qualquer fatalidade numa sociedade eminentemente de risco. Nesse sentido, alerta Nelson Rosenvald "se a vitimização é aleatória, sua origem também tende a se tornar aleatória, em virtude do cálculo de probabilidade que situa todas as ocorrências sob o signo do acaso. Tudo se torna fatalidade, que é o exato oposto da responsabilidade. Fatalidade é ninguém; responsabilidade é alguém" (op. cit., p. 31). Na mesma trilha, o entendimento desta Terceira Turma reconhece a necessidade de se buscar uma justificação jurídica para se imputar a responsabilidade civil àquele que não se encontra atrelado ao dano por uma perspectiva tradicionalmente causal (REsp n. 1.606.360/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 30/10/2017). Essa transmudação da imputação meramente causal em normativa se encontra incorporada ao nosso ordenamento jurídico por meio do Código de Defesa do Consumidor (arts. 12 e 14), bem como dos casos legais de aplicação da teoria do risco-proveito estabelecida genericamente no parágrafo único do art. 927 do CC/2002 ("Parágrafo único).

Porém, essa evolução jurídica da responsabilidade civil ainda não se fazia clara sob a vigência do Código Civil de 1916, o qual adotava o viés eminentemente subjetivo da responsabilização, e impunha a imputação de uma conduta, mais que lesiva, ilícita e culposa, mesmo após a promulgação da Constituição Cidadã (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil.12ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2015, p. 3-8). Nesse sentido, Ruy Rosado de Aguiar, em voto proferido no julgamento do REsp n. 209.062/RJ, Quarta Turma, julgado em 22/6/1999, DJ 5/8/2002, p. 345, assim se manifestava: Um dos princípios sobre o qual o nosso sistema de responsabilidade civil está construído é o de que o ato lícito não gera indenização. A regra sofre exceções, porém, em algumas situações específicas, como as que decorrem do risco - onde se pode indenizar dano sem conduta ilícita - e a contemplada no art. 160, inc. II, do CCivil, que descreve um comportamento lícito mas, nos termos dos arts. 1519 e 1520 do CCivil, gerador da obrigação de reparar o dano causado pelo necessitado contra terceiro que não provocou o perigo.”

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Se o agente financeiro age com boa-fé na negociação de empréstimo, no exercício regular de direito, pratica o negócio jurídico de forma lícita, de forma que cabe aplicar o Código Civil:

Art. 160. Não constituem atos ilícitos: I - Os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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