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Bloqueio de verba pública para garantir o fornecimento de fármaco

Bloqueio de verba pública para garantir o fornecimento de fármaco

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Os tribunais superiores têm firmado entendimento de que o Estado, quando condenado ao fornecimento de medicamentos e, ainda assim, permanece inerte, pode ter suas contas bloqueadas.

1. INTRODUÇÃO

A possibilidade de bloqueio de verba pública, dentre as medidas atípicas dos meios executivos já conhecidos na atual codificação processual civil, para compelir o Estado a fornecer medicamento, já é uma realidade vivenciada pela sociedade.

Portanto, torna-se mister discorrer sobre o direito à saúde, como direito social e fundamental a ser observado e respeitado pela Pessoa Jurídica de Direito Público, ou seja, o próprio Estado. Ato contínuo, discorre-se sobre a efetividade no cumprimento das decisões judiciais, e ao término, sobre a real possibilidade de compelir o ente estatal ao fornecimento de fármaco, mediante provimento judicial de bloqueio de verba pública.

Nessa toada, diante das problemáticas supracitadas, o bloqueio da verba pública do ente estatal para o fornecimento de fármaco é o principal objetivo a ser alcançado com a apresentação do presente artigo, tendo como justificativa o basilar princípio constitucional, a saber: dignidade da pessoa-humana.

O presente artigo tem seu conteúdo alicerçado na Jurisprudência, trabalhos desenvolvidos por graduados, especialistas e doutrinadores, apresentações de palestrantes e conferencistas que debateram e apresentaram conceitos relevantes vinculados ao tema, fornecendo assim base necessária para a compreensão sobre os poderes conferidos aos magistrados, no âmbito da legislação Processual Civil, com ênfase na real possibilidade de bloqueio de verba pública do Estado.

Buscou-se observar, inicialmente, na seara do direito positivo, os direitos constitucionais no seu aspecto social e fundamental, além de princípios constitucionais que norteiam a personalidade do ser humano, notadamente o acesso à justiça, direito à saúde e a dignidade da pessoa-humana.

Foram considerados como relevantes as palestras, simpósios, jurisprudências, debates e concepções de diversos doutrinadores e estudiosos sobre os assuntos relacionados ao presente artigo.

Aproveitou-se também a oportunidade para verificar as complexidades e óbices enfrentados pela grande parte da sociedade, no que se refere ao acesso a tratamento médico, bem como a medicamentos eficazes de alto custo não protocolados no Sistema Único de Saúde ou não regulados pela ANVISA.

No caminho para se chegar ao resultado do presente artigo, verificaram-se também medidas atípicas para garantir o cumprimento de decisão judicial, como ferramentas para compelir o Estado ao fornecimento de fármaco.

De fato, foram de grande valia os instrumentos utilizados para atingir os objetivos propostos no presente trabalho, a saber: livros, artigos, trabalhos científicos, acesso a sitios eletrônicos, vídeos postados em canais de comunicação global e utilização de arquivos em bibliotecas de universidades.

A classificação da pesquisa do presente artigo é a pesquisa bibliográfica, haja vista o estudo e análise realizada em teorias publicadas em diversos tipos de fontes: livros, artigos, manuais, enciclopédias, anais e meios eletrônicos.

O mesmo procedimento foi utilizado para a coleta de dados para cumprir os objetivos específicos, sendo estes: indicar o direito à saúde como dever constitucional do Estado; verificar a efetividade no cumprimento das decisões judiciais; abordar sobre a judicialização da saúde como uma realidade vivida pela sociedade; e analisar a possibilidade de compelir o ente estatal ao fornecimento de fármaco, mediante provimento judicial de bloqueio de verba pública.


2. O DEVER DO ESTADO E A GARANTIA DO DIREITO À SAÚDE

Ao ser analisado o dever do Estado e o direito à saúde, torna-se necessário tecer algumas considerações sobre a existência de direitos fundamentais e outros decorrentes do regime e dos princípios da Constituição ou dos Tratados Internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

A grande questão que permeia as discussões a respeito de direitos humanos é que, mesmo sendo assegurados nas Declarações de Direitos e Constituições dos Estados Nacionais e, embora tendo inúmeras organizações de defesa desses direitos, estes não são respeitados, sendo vários os motivos pelos quais não se consegue a sua efetivação. (FIORIN, 2012, p. 111).

É o campo em que aparece a maior defasagem entre a norma e sua efetiva aplicação, sendo que muitas vezes os aplicadores do Direito esquecem (ou não querem aplicar), do estabelecido no § 1º do artigo 5º (as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata), da Carta Magna brasileira de 1988. (FIORIN, 2012, p. 111).

Grande parte das vezes sua concretude é negada pelo próprio poder público, o qual é ao mesmo tempo protetor e adversário dos direitos humanos e o responsável direto pela sua possível efetividade, vez que os direitos humanos de liberdade normalmente buscam limitar o poder do Estado ou, então, os direitos sociais buscam a ampliação desse poder ou, ainda, devido à falta de regulamentação por leis complementares para dar vigência efetiva a direitos formais. (FIORIN, 2012, p. 112).

Após as graves violações de direitos humanos ocorridos durante a 2ª guerra mundial, houve um alerta e grande preocupação dos Organismos Internacionais. Nessa esteira, com a criação da Organização das Nações Unidas, foram estabelecidas regras por intermédio de tratados, no intuito de expandir os direitos do ser humano e limitar o poder do Estado.

O direito à saúde, cláusula pétrea prevista constitucionalmente, revela-se como direito social fundamental e obrigacional, a ser observado e prestado de forma eficiente pelo ente estatal. A universalização da saúde encontra guarida no art. 196 da Constituição da República, bem como no art. 6º da mesma carta promulgada.

Da exegese da interpretação dos artigos supramencionados, extrai-se a responsabilidade do Estado de forma impositiva. Nesse sentido, não importa como, ou de que forma o ente estatal irá se planejar para promover o direito à saúde. Relevante é, que o assegure de forma efetiva.

Nessa toada, a saúde se tipifica como um bem jurídico indissociável do direito à vida, é certo que o Estado o dever de tutelá-la. O Poder Público, qualquer seja a esfera institucional no plano da organização federativa brasileira, não pode se mostrar indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional (PRETEL, 2010).

Portanto, denota-se que omissão estatal consubstanciada no descumprimento dos preceitos constitucionais, mormente quanto à área da saúde, ensejam graves violações ao princípio da dignidade da pessoa humana, direito de personalidade, bem como direitos fundamentais.

Segundo a Constituição Federal de 1988, a saúde é direito de todo o cidadão e um dever do Estado. A mesma Constituição estabelece garantias fundamentais a brasileiros e estrangeiros, residentes ou não no país. Ademais, o acesso ao sistema de saúde, que adensa o conteúdo do Direito Fundamental em comento, pretende-se universal, o que significa que cada um e todos os brasileiros podem e devem usufruir, através de políticas públicas, da proteção e recuperação da saúde (MOURA, 2015).

O direito à saúde, em relação à conduta Estatal possui duas vertentes: uma em que o cidadão tem direito de exigir do Estado que este mantenha uma conduta positiva, ou seja, que ele tome medidas visando a prevenção e o tratamento das doenças. E a outra em que o cidadão tem direito de exigir do Estado que este mantenha uma conduta negativa, ou seja, que ele se abstenha de praticar quaisquer atos que prejudiquem a saúde. (CANOTILHO; MOREIRA, 2007, p. 825).

Ainda sobre o dever Estatal, a saúde encontra-se entre os bens intangíveis mais preciosos do ser humano, digna de receber a tutela protetiva estatal, porque se consubstancia em característica indissociável do direito à vida. Dessa forma, a atenção à saúde constitui um direito de todo cidadão e um dever do Estado, devendo estar plenamente integrada às políticas públicas governamentais. (ORDACGY, 2009, p. 16).

Logo, o reconhecimento de direitos sociais no corpo da Constituição Federal é a evidência de ter o Estado brasileiro adotado a configuração de um Estado Democrático de Direito, cuja finalidade se diferencia daquela adotada pelos Estados liberais, vez que objetiva assegurar o direito à igualdade em aspectos formais e materiais (LADEIRA, 2009, p. 106).

Na mesma esteira, com o advento da Constituição Federal de 1988, objetivou-se estabelecer garantias fundamentais a todo cidadão, propiciando aos indivíduos condições mínimas para o pleno gozo de seus direitos.

A partir de então, incluiu-se ao rol dos direitos fundamentais os direitos sociais, consagrando, por conseguinte, o direito à educação, à saúde, à alimentação, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade e à infância, à assistência aos desamparados (MALLMANN, 2012).

Os direitos sociais são, por conseguinte, sobretudo, endereçados ao Estado, para quem surgem, na maioria das vezes, certos deveres de prestações positivas, visando à melhoria das condições de vida e à promoção da igualdade material (BONTEMPO, 2005, p. 71).


3. A EFETIVIDADE NO CUMPRIMENTO DAS DECISÕES JUDICIAIS

Tema de vital importância no que se refere à garantia do direito declarado em provimentos judiciais, pois o processo tem que ser efetivo, ou seja, capaz de produzir resultados.

Logo, necessário se reportar ao art. 4º do Novo Código de Processo Civil, que traz expressamente em seu corpo o princípio da efetividade, a saber: as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa; e ao art. 6º do mesmo instituto: Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.

Justiça e efetividade, como metas do processo democrático, exigem que o processo assegure o pleno acesso à justiça e a realização das garantias fundamentais traduzidas nos princípios da legalidade, liberdade e igualdade.

Nessa ordem de ideais, o processo, como já visto, consagra o direito à defesa, o contraditório e a paridade de armas (processuais) entre as partes, a independência e a imparcialidade do juiz, a obrigatoriedade da motivação dos provimentos judiciais decisórios e a garantia de uma duração razoável, que proporcione uma tempestiva tutela jurisdicional (THEODORO, 2017, p. 85).

A noção de processo justo está intimamente ligada à efetividade da prestação jurisdicional, de modo a garantir a todos o acesso à justiça, em tempo que não extrapole os limites do razoável. Com isso, entende-se a necessidade de a justiça efetiva aparelhar-se para propiciar ao titular do direito um provimento que seja contemporâneo à lesão ou ameaça de lesão, consistindo em uma solução justa para o litígio (THEODORO JÚNIOR, 2017, p. 85).

No entanto, não basta que a lide seja solucionada em prazo razoável, a efetividade somente é alcançada se, aliada à brevidade, se outorga aos litigantes a plena tutela jurisdicional. O processo justo e efetivo, portanto, deve viabilizar uma solução rápida para disputa apresentada ao juiz, mas sem deixar de observar e respeitar os direitos e as garantias fundamentais das partes (THEODORO JÚNIOR, 2017, p. 85).

Sucintamente, constitucionalmente reconhecida como direito fundamental, a efetividade da decisão representa a perfeita aplicabilidade da função jurisdicional, onde a parte vencedora da lide recebe o que lhe é devido, com razoável duração de tempo do processo e observância da segurança jurídica.

Da cláusula geral do devido processo legal podem ser extraídos por todos os princípios que regem o direito processual. Dela também se extrai o princípio da efetividade: os direitos devem ser, além de reconhecidos, efetivados. Processo devido é processo efetivo. O princípio da efetividade garante o direito fundamental à tutela executiva, que consiste na exigência um sistema completo de tutela executiva, no qual existem meios executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfação a qualquer direito merecedor de tutela executiva (DIDIER, 2017, p. 128).

Em consonância com o princípio da efetividade, partir da premissa de que existe um direito fundamental à tutela executiva é indispensável para a solução de diversos problemas oriundos do procedimento executivo, principalmente aqueles relacionados à aplicação das regras de proteção do executado, com as hipóteses de impenhorabilidade (DIDIER, 2017, p. 129).

Ainda sobre a efetividade das decisões judiciais, instrumentalismo e efetividade são ideais que se completam na formação do ideário do processualismo moderno. Para ser efetivo no alcance das metas de direito substancial, o processo tem de assumir plenamente sua função de instrumento. Há de se encontrar na sua compreensão e no seu uso a técnica que se revele mais adequada para que o instrumento produza sempre o resultado almejado, de sorte que, quanto mais adequado for para proporcionar tutela aos direitos subjetivos de natureza substancial, mais efetivo será o desempenho da prestação estatal (THEODORO JÚNIOR, 2017, p. 23).

Cabe a transcrição do caput do art. 497 da nova legislação processual civil, o qual apresenta claramente o princípio da efetividade em sua parte final; “Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente”.

É impossível fechar os olhos ao gravíssimo problema da demora na prestação jurisdicional. Mas o angustiante tempo entre o exercício da ação e a satisfação do direito material não pode servir de pretexto para que os autos dos processos sejam lidos como manchetes de jornais (FREIRE e CUNHA, 2016, p. 18).

O direito fundamental à tutela jurisdicional tem eficácia apenas sobre o Estado, pois se presta unicamente a vincular o modo de atuação da jurisdição, que possui a função de atender não apenas aos direitos fundamentais, mas a quaisquer direitos. É importante perceber, com efeito, que o direito fundamental à tutela jurisdicional, exatamente porque incide sobre o juiz, está preocupado com a efetividade da tutela de todos os direitos – e não apenas com a proteção dos direitos fundamentais. (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2017, p. 65).

A realidade social brasileira exige que seja realçado o princípio da efetividade da tutela jurisdicional, já que muitos não podem esperar para receber as pequenas quantias a que têm direito, a não ser com um custo muito alto, que em vários casos significa até mesmo fome e miséria. Aqueles que desejam uma jurisdição adequada aos novos dias e ainda tratam a ampla defesa como dogma devem parar para pensar que ela, ao garantir o réu, pode retirar muita coisa do autor (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2017, p. 314).

É certo que, para haver efetividade na prestação da tutela jurisdicional, a jurisdição deve ser distribuída entre os juízes e os órgãos do Poder Judiciário, pelo que o juiz, diante dos inúmeros conflitos que podem surgir no país, só pode exercer o poder jurisdicional em face de determinado grupo de casos, ou melhor, somente pode exercer sua capacidade de julgar em certa medida; quando se fala que o juiz apenas pode exercer sua competência dentro de certos limites, afirma-se que ele somente tem competência para certo grupo de casos. (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2017, p. 25).

Seguindo a ordem estabelecida pela norma, destaca-se como segundo poder o de dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-se às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito, poder que não é ilimitado, devendo ser exercido em consonância com o princípio da fundamentação ou da motivação. (MONTENEGRO FILHO, 2016, p. 210).

Na atualidade, o fim esperado em qualquer execução é o de que se atribua ao credor exatamente aquilo que o título lhe confere, de modo que, se a sentença condenou o réu a pagar determinada soma em dinheiro, se isso não ocorrer, espera-se que a função jurisdicional executiva efetue a penhora de bens do executado para alienação e entrega do produto da venda forçada ao credor, o que deve ocorrer no menor espaço de tempo possível, em atenção ao princípio da efetividade do processo de execução. (MONTENEGRO FILHO, 2016, p. 678).


4. A JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE

O termo “judicialização da saúde” ou “judicialização do SUS”, tem sido atribuído por doutrinadores e pela jurisprudência devido a intervenção Poder Judiciário no fornecimento de medicamento à população, sem a observância dos limites traçados pelas políticas públicas desenvolvidas pelo Ministério da Saúde. Isto porque, nos últimos anos, tem aumentado a quantidade de demandas judiciais envolvendo a área da saúde, em face do Poder Público.

A judicialização da saúde é a utilização do Poder Judiciário para tentar resolver problemas que não são resolvidos dentro do próprio Sistema Único de Saúde.

A judicialização da saúde é uma expressão cada vez mais presente nos cenários de assistência à saúde no Brasil, materializada, principalmente, pelos mandados judiciais para a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos, consultas, internações e dispensação de insumos médico-cirúrgicos (RAMOS; GOMES, 2014, p. 01).

A demanda por medicamentos tem se expressado no crescente número de ações judiciais individuais e coletivas, sobretudo as individuais. Os estudos sobre o tema ressaltam, em geral, o impacto negativo deste aumento exponencial para a gestão, o orçamento público e o uso racional dos procedimentos terapêuticos.

O debate atual tem dado especial atenção para as ordens judiciais que determinam o pagamento ou o fornecimento imediato pelos gestores do SUS, de determinado medicamento e/ou procedimento não disponibilizados pelo sistema público de saúde brasileiro, ou de uso não autorizado no Brasil (CONASS, 2011, p. 131).

Nos últimos 10 anos a judicialização tem sido crescente, é um fenômeno nacional por força de diversos problemas desde a falta de investimento, a falta de infraestrutura e também porque acabou sendo hoje uma solução para algumas pessoas que precisam de medicamentos que não estão dentro da política pública de saúde ou pela falha na própria execução da política pública de saúde.

Os principais problemas gerados pela judicialização da saúde são: a desorganização do sistema de saúde, a judicialização transfere para o juiz o poder de deliberar sobre políticas públicas de saúde, e essas deliberações via de regra tem sido sobre o ponto de vista individual, concedendo para indivíduos direitos que não estão plasmado nas políticas públicas de saúde.

Isso acaba fazendo com que o Poder Judiciário seja quem decide onde aplicar e para quem, ao invés de ser feito de modo global, de modo harmônico para atender a maioria ou a todos que precisem (NETO, 2015).

A judicialização tem uma óbvia faceta negativa. É que na medida em que uma matéria precisa ser resolvida mediante uma demanda judicial, é sinal de que ela não pode ser atendida administrativamente. É sinal de que ela não pode ser atendida de modo natural de atendimento das demandas, que é por vias de soluções legislativas, soluções administrativas e soluções negociáveis.

A faceta positiva é que quando alguém tem um direito fundamental e este não foi observado é muito bom poder ir ao poder judiciário e merecer esta tutela.

Quando alguém vai a juízo postular um medicamento ou um procedimento simplesmente porque não existe uma política pública em relação aquela necessidade ou a política pública manifestamente inadequada, o judiciário deve agir, não apenas atendendo a postulação individual, mas onde não exista política pública.

Nada obstante, tal aspecto quantitativo não tem, pura e simplesmente, o condão de abranger toda a análise sobre a verdadeira problemática da judicialização que, pelo contrário, refere-se muito mais às condições e aos efeitos destas normas em relação ao Estado, à sociedade, aos cidadãos e ao próprio Direito. (FUHRMANN, 2016, p. 128).

Judicialização, especialmente compreendida como produção intensificada do direito positivo, se antepõem, dentre outros, argumentos que se baseiam na formalização; na desintegração; na desestabilização; e nos limites jurídicos da capacidade de ação governamental. O aspecto da formalização se relaciona com o estreitamento do espaço de decisão do titular da decisão política “die Einengung des Entscheidungspielraums der politischen Entscheidungsträger”.

Neste sentido, no lugar de um poder pragmático de decisão política, instaura-se a técnica da formalidade, própria do Direito. Judicialização significa “neutralidade” e “formalização jurídica”, afastando-se das decisões de poder (político) (FUHRMANN, 2016, p. 156).

O termo “judicialização” tem sido empregado com um inequívoco sentido pejorativo, de excesso de atuação do Poder Judiciário em questões que atinem, em primeira linha, à atuação dos poderes representativos da democracia parlamentar, cujo principal argumento para a sua auto-restrição se fundamenta no princípio da separação de poderes, mais especificamente na reserva parlamentar em questão orçamentária.

Grande parte das demandas judiciais que envolvem o direito à saúde se refere, em primeira linha, ao não cumprimento pelos Poderes Públicos de obrigação já regulamentada na esfera legislativa e incorporada em política pública pré-definida pelos órgãos da Administração Pública, de modo que, aqui, não há de se falar em limitação no espaço decisório da política, designadamente dos Poderes Legislativo e Executivo (FUHRMANN, 2016, p. 159).

Sobre o fenômeno da judicialização da saúde no direito brasileiro, o promotor de justiça Rogério Queiroz, em uma apresentação no canal do youtube, assim relata:

Com o reconhecimento pelo Supremo Tribunal Federal ao direito subjetivo à saúde, passamos a observar um fenômeno que, pejorativamente, recebeu o nome de judicialização da saúde. Os cidadãos passaram a pleitear do Sistema Único de Saúde o fornecimento de medicamentos experimentais, tratamentos no exterior, e demais prestações não contempladas em relações nacionais de ações e serviços de saúde ou de medicamentos e protocolos. Isso gerou um impacto significativo no orçamento do sistema, comprometendo por vezes, a atuação dos gestores ou o fornecimento e a assistência à própria população. (QUEIROZ, 2015).

Indubitavelmente, não há como se furtar em dizer que o cumprimento dos provimentos judiciais que condenam o Estado a fornecer medicamento ou atendimento especializado, provocam impactos em sua programação orçamentária.

Assim, a judicialização da saúde interfere diretamente na operacionalidade da administração pública Estadual, que devem criar e manter uma estrutura administrativa eficiente, somente para atender as decisões judiciais concernentes à saúde.

Um tema persistente que perpassa as discussões refere-se ao marketing comercial e/oulobby exercido pela indústria e comércio farmacêutico, junto a segmentos sociais (pesquisadores, pacientes, médicos) e governamentais, para incorporação de seus produtos, o que poderia estar exercendo papel importante no sentido de estimular a demanda judicial para incorporação de novos medicamentos.

Também se chama atenção para a forte dependência dos estados nacionais das indústrias farmacêuticas, tanto no desenvolvimento das pesquisas clínicas como em relação ao custo da incorporação das novas tecnologias nos sistemas de saúde.

Nesse sentido, a equidade no acesso à saúde e a discussão sobre os efeitos da judicialização da saúde são relacionadas às questões de alocação de recursos públicos para pesquisa e assistência; do uso racional das novidades tecnológicas e científicas na prática médica, nos sistemas de saúde e também à propriedade intelectual.

Destaca-se, neste âmbito, a necessidade de se estabelecer um padrão de assistência e/ou critérios para a incorporação e o acesso aos procedimentos e insumos na assistência pública à saúde que conduzam à equidade e integralidade no acesso a este bem de saúde, tornando a assistência farmacêutica mais efetiva (VENTURA; SIMAS; PEPE; SCHRAMM, 2010, p. 80).

Tem-se observado, nos últimos anos, uma linha ascendente em franca evolução no que diz respeito ao número das demandas judiciais em saúde propostas contra o Poder Público (NETTO, 2010, p. 92).

De acordo com um estudo realizado pelo Conselho Nacional dos Secretários de Saúde, o aumento dessas ações se deve ou à falta de determinados medicamentos, ou à recusa de se efetuar o fornecimento em razão da indicação estar em desacordo com os protocolos clínicos, ou ainda, por se tratar de medicamento não padronizado e não disponível no mercado nacional (geralmente de elevadíssimo custo) (NETTO, 2010, p. 92).

Pode também ser mencionado o interesse da indústria farmacêutica em inserir novas tecnologias no mercado, por meio do lançamento de insumos de alto custo, sem garantia de eficácia do tratamento e/ou da significativa vantagem em relação ao produto já inserido no SUS (NETTO, 2010, p. 93).

Assim, tornou-se a via judicial o instrumento mais eficaz para assegurar o fornecimento de determinados insumos em detrimento dos critérios técnicos e financeiros apontados pelos gestores, num verdadeiro processo de judicialização das políticas públicas de saúde (NETTO, 2010, p. 93).

Em sede de julgamento do ARE 801676 AgR/PE, o Supremo Tribunal Federal entende que “na colisão entre o direito à vida e à saúde e interesses secundários do Estado, o juízo de ponderação impõe que a solução de conflito seja no sentido de preservação do direito à vida”.

Foi julgada no Supremo Tribunal Federal a ADI 5501/2016, que versava sobre a distribuição de medicamento e necessidade de registro sanitário.

O Plenário, por decisão majoritária, deferiu medida liminar em ação direta de inconstitucionalidade para suspender a eficácia da Lei 13.269/2016, que autoriza o uso do medicamento fosfoetanolamina sintética por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna, a despeito da inexistência de estudos conclusivos no tocante aos efeitos colaterais em seres humanos, bem assim de ausência de registro sanitário da substância perante o órgão competente.

O Colegiado entendeu que, ao suspender a exigibilidade de registro sanitário do medicamento, a lei impugnada discrepa da Constituição (art. 196) no tocante ao dever estatal de reduzir o risco de doença e outros agravos à saúde dos cidadãos. O STF, em atendimento ao preceito constitucional, tem proferido decisões a garantir o acesso a medicamentos e tratamentos médicos, cabendo aos entes federados, em responsabilidade solidária, fornecê-los.

O caso, entretanto, não se amolda a esses parâmetros. Sucede que, ao dever de fornecer medicamento à população contrapõe-se a responsabilidade constitucional de zelar pela qualidade e segurança dos produtos em circulação no território nacional, ou seja, a atuação proibitiva do Poder Público, no sentido de impedir o acesso a determinadas substâncias. Isso porque a busca pela cura de enfermidades não pode se desvincular do correspondente cuidado com a qualidade das drogas distribuídas aos indivíduos mediante rigoroso crivo científico.

Na elaboração do ato impugnado, fora permitida a distribuição do remédio sem o controle prévio de viabilidade sanitária. Entretanto, a aprovação do produto no órgão do Ministério da Saúde é condição para industrialização, comercialização e importação com fins comerciais (Lei 6.360/1976, art. 12).

O Juiz Federal da 4ª Região, Doutor Schulze, em uma palestra sobre a Judicialização da Saúde segundo a jurisprudência do STF e do STJ, explana que:

Não basta só julgar com base na ciência jurídica, deve se verificar um rigoroso crivo científico. Terceiro: “não é permitida a distribuição do remédio sem o controle prévio da viabilidade sanitária”. Ou seja, há uma necessidade de participação os órgãos que fazem a análise técnica, da perspectiva da ciência médica.

Por conseguinte, é absolutamente racional inferir que o surgimento da judicialização da saúde tem como causa vários fatores, como por exemplo: a violação de direitos sociais, a ausência de protocolos para determinados medicamentos, bem como a ineficiência administra do Sistema Único de Saúde, ocasionando dessa forma a interferência do Poder Judiciário, depois de provocado, nas demais esferas administrativas governamentais.


5. BLOQUEIO DE VERBA PÚBLICA COMO MEDIDA JUDICIAL PARA COMPELIR O ENTE ESTATAL AO FORNECIMENTO DE FÁRMACO

Conforme decisão constante no REsp 1.069.810-RS, de 23 de outubro de 2013, entende o Superior Tribunal de Justiça pela possibilidade de bloqueio de verba pública para garantir o fornecimento de medicamentos. Portanto, no caso de demora no cumprimento da obrigação que acarrete risco à saúde, bem como à vida do autor, é possível ao magistrado determinar de ofício ou a requerimento das partes, o referido bloqueio como medida coercitiva para o fornecimento de fármaco.

O Relator em sede de julgamento do Recurso Especial supracitado, entendeu que:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. ADOÇÃO DE MEDIDA NECESSÁRIA À EFETIVAÇÃO DA TUTELA ESPECÍFICA OU À OBTENÇÃO DO RESULTADO PRÁTICO EQUIVALENTE. ART. 461, § 5º DO CPC. BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS. POSSIBILIDADE CONFERIDA AO JULGADOR, DE OFÍCIO OU A REQUERIMENTO DA PARTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. ACÓRDÃO SUBMETIDO AO RITO DO ART. 543-C DO CPC E DA RESOLUÇÃO 08/2008 DO STJ.

1. Tratando-se de fornecimento de medicamentos, cabe ao juiz adotar medidas eficazes à efetivação de suas decisões, podendo, se necessário, determinar até mesmo, o sequestro de valores do devedor (bloqueio), segundo o seu prudente arbítrio, e sempre com adequada fundamentação. 2. Recurso Especial provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 08/2008 do STJ. (STJ – RESP: 1069810 RS 2008/0138928-4, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 23/10/2013, S1 – PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 06/11/2013).

O Superior Tribunal de Justiça também entendeu ser possível o bloqueio de verbas públicas, como medida executiva ao julgar o REsp 735378/RS.

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS PELO ESTADO A PESSOA HIPOSSUFICIENTE. DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS. MEDIDA EXECUTIVA. POSSIBILIDADE, IN CASU. PEQUENO VALOR. ART. 461, § 5.º, DO CPC. ROL EXEMPLIFICATIVO DE MEDIDAS. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL À SAÚDE, À VIDA E À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PRIMAZIA SOBRE PRINCÍPIOS DE DIREITO FINANCEIRO E ADMINISTRATIVO.1. Recurso especial que encerra questão referente à possibilidade de o julgador determinar, em ação que tenha por objeto a obrigação de fornecer medicamentos a hipossuficiente portador de Cardiopatia hipertensiva, medidas executivas assecuratórias ao cumprimento de decisão judicial antecipatória dos efeitos da tutela proferida em desfavor de ente estatal, que resultem no bloqueio ou sequestro de verbas deste depositadas em conta corrente. (STJ. 1ª Turma. REsp 735378. Rel. Min. Francisco Falcão. Publicado no DJ de 08/06/2006).

Embora a ementa transcrita não demonstre a real extensão do pronunciamento do STF sobre o assunto, a ministra relatora Ellen Gracie deixou assentado em seu voto o seguinte:

Ademais, verifico que a matéria já se encontra pacificado no âmbito desta Corte, no sentido da possibilidade do bloqueio de verbas públicas para garantir o fornecimento de medicamentos. Cito os seguintes julgados: AI 553.712-AgR, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, DJe 4.6.2009; AI 597.182-AgR, rel. Min. Cezar Peluso, 2ª Turma, DJ 6.11.2006; RE 580.167, rel. Min. Eros Grau, DJe 26.3.2008; AI 669.479, rel. Min. Dias Toffoli, DJe 17.12.2009; RE 562.528, de minha relatoria, DJ 6.10.2005; AI 640.652, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 27.11.2007; e AI 724.824, rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 23.9.20008.

Completa a Ministra Ellen Gracie em seu voto:

Desse modo, entendo que, com o reconhecimento da existência da repercussão geral e havendo entendimento consolidado da matéria, os Tribunais de origem e as Turmas Recursais podem, desde logo, com fundamento no § 3º do citado art. 543-B, aplicar a citada orientação anteriormente firmada por este Supremo Tribunal Federal.

O Procurador Federal Gustavo D'Assunção Costa, em artigo publicado na internet, infere que: “desse modo, restou admitido pelos Tribunais Superiores o bloqueio de verbas públicas enquanto meio coercitivo atípico apto a garantir o efetivo cumprimento da decisão judicial que determina o fornecimento de medicamento pelo Estado” (COSTA, 2014).

Assim, observando-se os julgados supracitados, verifica-se que resta por mais do que comprovada a possibilidade de Bloqueio de verba pública como medida judicial para compelir o ente estatal ao fornecimento de fármaco.

Abrilhanta o presente trabalho a indicação de alguns dispositivos do Novo Código de Processo Civil, que correlaciona o bloqueio de verba pública à atipicidade dos meios executivos. Logo, o artigo 139, inciso IV, prescreve que “o juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”.

Já o artigo 297, do mesmo dispositivo preconiza que “o juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória”.

Também o artigo 536 assim expõe “no cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente”.

Vislumbra-se, desse modo, que no cenário do processo civil contemporâneo, tanto em sede de tutela de urgência quanto em cumprimento de sentença, busca-se primordialmente a satisfação do direito do autor, competindo ao juiz, como representante do Estado e em atenção aos critérios teleológicos de interpretação da lei, determinar a execução de medidas eficazes à garantia de resultado prático equivalente ao adimplemento da obrigação, a fim de viabilizar a realização da verdadeira justiça.

Para atender aos anseios das partes e de resguardar a efetividade das decisões judiciais nos processos que envolvem a concessão de medicamentos pelo Estado a particulares, é praxe a cominação de “penalidades” voltadas a assegurar o resultado prático visado na demanda, qual seja, a entrega do tratamento médico pleiteado.

Execução é um conjunto de meios materiais disciplinados em lei e à disposição da justiça objetivando a satisfação do direito material comprovado por título executivo, e consiste na prática de atos jurisdicionais tendentes à realização material do direito atual ou potencialmente violado.

Execução descreve a atividade jurisdicional voltada à satisfação do direito tal qual reconhecido, a prestação concreta da tutela jurisdicional executiva. Trata-se de um conjunto de atos estatais com os quais invade-se o patrimônio do executado, para que, às suas custas, realize-se o resultado prático desejado concretamente pelo direito material (VERAS e RICALDE, 2017, p. 15).

Dessa forma, constata-se que a efetividade do provimento judicial é concretizado com a entrega do direito material pleiteado em juízo, valendo-se o jurisdicionado de medidas atípicas executivas para tal feito.

Dentre as medidas atípicas executivas está o bloqueio de verba pública, podendo o requerente receber o direito pleiteado em pecúnia, e assim adquirir o remédio ou o tratamento que necessita.

Embora a resposta do Poder Judiciário às demandas judiciais que buscam o fornecimento de medicamentos se concretize mediante o bloqueio de verba pública, consubstanciado pela judicialização da saúde, tal medida, de outro vértice, gera também um grande impacto orçamentário no erário, sendo este o principal aspecto negativo.

Ocorre que, anualmente a Administração Pública Estadual e Municipal elabora o seu orçamento objetivando a partir de seu fluxo de ingressos e saídas de recursos, desenvolver seus programas, ações e projetos, a fim de garantir a execução de políticas públicas de atendimento às necessidades dos cidadãos.

Nesse sentido, cada vez que o pleito jurisdicional é atendido, principalmente quando o objeto se tratar de medicamentos de alto custo, ou que envolvam tecnologias desenvolvidas em outros Países, há de se rever ou suspender programas e ações direcionados para o atendimento à atenção básica do cidadão, consideração ainda a realidade da limitação orçamentária dos Estados e Municípios.


6. CONCLUSÃO

De acordo com as informações obtidas para a instrução do presente trabalho, principalmente aquelas oriundas de acórdãos, verifica-se que os tribunais superiores têm firmado entendimento de que o Estado, quando condenado ao fornecimento de medicamentos e permanece inerte, é possível a determinação de bloqueio judicial das contas do Ente condenado, para garantir o cumprimento da determinação judicial.

Foram consideradas análise de grande relevância, as medidas judiciais executivas (bloqueio de verba pública para fornecimento de remédios), determinadas pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RESP: 1069810 RS 2008/0138928-4, sendo Relator o Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, bem como do julgamento do REsp 735378, sendo Relator o Ministro FRANCISCO FALCÃO.

Considerando os dados colhidos no gráfico da figura 1, reforça a tese de que a judicialização da saúde representa uma realidade vivida pela sociedade, ficando claramente comprovada em números que, demandas judiciais relativas à saúde cresceram 130% em 10 anos.

Por derradeiro, o presente trabalho constata que o direito fundamental à saúde merece especial proteção do Estado, possuindo previsão expressa nesse sentido, contida no art. 196 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Nesse sentido, o Poder Público deve protegê-la, promovê-la e recuperá-la, mediante implantação de políticas sociais e econômicas no intuito de reduzir os riscos de doenças e de outras complicações nosológicas, garantido o livre acesso universal e igualitário.

Porém, as políticas públicas atualmente implantadas mostram-se, por vezes, insuficientes ou ineficazes para o fornecimento de fármacos necessários ao tratamento de saúde daqueles que necessitam do medicamento, seja porque não estão contemplados nas listas padronizadas do Sistema Único de Saúde, seja porque o paciente não preenche os requisitos estabelecidos nos protocolos criados para a concessão dos fármacos e/ou serviços.

Ocorre que na maioria dos casos, o acesso à saúde, principalmente quando se trata de uso de medicamento de forma contínua, é obstaculizado pelo próprio poder público, urgindo a necessidade de se socorrer ao Poder Judiciário para compelir o ente estatal, ao fornecimento do medicamento, seja em sede de tutela de urgência, ou em sede de cumprimento de sentença.

Por conseguinte, o magistrado, a fim de dar efetividade ao provimento jurisdicional, utiliza o sequestro de verbas públicas, como forma mais eficaz, para o fornecimento do medicamento pleiteado pelo autor.

Considerando o mundo contemporâneo, bem como a evolução do direito na busca incessante do atendimento dos anseios da sociedade, infiro não haver mais espaço para atos procrastinatórios e impeditivos violadores dos direitos sociais e fundamentais, pois nada pretere à vida.

Diante do exposto, em que pese o aspecto negativo gerado pelo bloqueio de verba pública, ou seja, a interrupção de políticas públicas de longo prazo, na busca de benefício de um número maior de pessoas, resta por concretizada, com a apresentação do presente artigo, valendo-se da atipicidade dos meios executivos, a real possibilidade de compelir o ente estatal ao fornecimento de fármaco, mediante provimento judicial de bloqueio de verba pública.


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