Da prestação de contas nas pensões alimentares

12/03/2020 às 13:45
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O artigo versará acerca do conceito e da natureza jurídica da Ação de Exigir Contas, se há existência de interesse processual no ajuizamento de ação de exigir contas relativas a obrigações alimentares.

O artigo versará acerca do conceito e da natureza jurídica da Ação de Exigir Contas, se há existência de interesse processual no ajuizamento de ação de exigir contas relativas a obrigações alimentares, bem como o entendimento fixado pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça que a inadmitiu nos casos da obrigação alimentícia.

INTRODUÇÃO

O escopo da ação de exigir contas é liquidar o relacionamento jurídico existente entre as partes no aspecto econômico, na qual é possível se determinar, ao final, a existência ou não de um saldo. Havendo saldo positivo será fixado um montante, cujo efeito gerará a condenação judicial contra a parte qualificada como devedora.

Doravante, o montante fixado será conteúdo de título executivo judicial, podendo ser exigido nos próprios autos, consoante determina o procedimento de cumprimento de sentença. Desta feita, o foco principal da ação de exigir contas é a obtenção da condenação do pagamento da soma que resultar o débito de qualquer das partes no acerto de contas.

Consoante o Código de Processo Civil, a ação de prestação de contas é uma ação especial de conhecimento com predominante ação condenatória, cuja meta é dotar aquele que se ver reconhecido na qualidade de credor, a possibilidade para executar o devedor mediante título executivo extrajudicial, após restar-se claro o saldo final do balanço aprovado em juízo, nos moldes da execução por quantia certa.

Conquanto a existência da ação de exigir contas, a utilidade de tal provimento mostra-se em descompasso no que tange à administração dos valores pagos a título de obrigação alimentar, uma vez que esta sendo paga é irrepetível, não podendo ser devolvida, independentemente do método escolhido pela detentora da guarda para geri-la, ou seja, a sentença, mesmo que favorável e reconhecendo credito para o autor, padeceria de utilidade, uma vez que não existe possibilidade de ressarcimento.

DESENVOLVIMENTO 

Com o advento do NCPC, a ação de exigir contas ocorre mediante procedimento especial cuja prestação de contas será feita pelo rito comum. Nesse contexto, dispõe Humberto Theodoro que “o objetivo da ação de exigir contas é liquidar o relacionamento jurídico existente entre as partes no seu aspecto econômico, de tal modo que, afinal, se determine, com exatidão, a existência ou não de um saldo”.

Data vênia é possível concluir que a ação de exigir contas pressupõe a existência de um vínculo jurídico entre dois sujeitos de direito, na qual, em decorrência da natureza da relação, com o escopo de ocasionar ao termo final a obrigação de que haja um acerto entre ambas as partes.

Não obstante, no que tange as obrigações alimentares, na maioria dos casos, quem não detém a guarda adquire tal incumbência em relação à prole. E ao detentor da guarda, cabe o encargo de ministrar os respectivos valores no melhor interesse da criança, tendo como escopo garantir e assegurar todos os direitos inerentes a esta. Doravante, cumpre alinhavar que o responsável pela prestação alimentar que não detém a guarda, consoante determina a lei, tem a obrigação de supervisionar os interesses do filho e solicitar ao genitor que a detenham, informações sobre qualquer assunto que envolva os interesses da criança.

Assim preleciona o § 5º do artigo 1.583 do CC, vejamos:

“§ 5º A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos, e, para possibilitar tal supervisão, qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos."

Conquanto a previsão legal supracitada frisa-se que o genitor não detentor da guarda, apesar da obrigatoriedade de supervisionar os interesses da prole mediante a solicitação de informações ou prestações de contas, estas não podem ser exigidas judicialmente, uma vez que os valores pagos a título de alimentos possuem caráter de irrepetibilidade, ou seja, o valor recebido como pensão alimentícia integra o patrimônio do beneficiário, não havendo possibilidade de restituição, ainda que prove a má administração dos recursos.

Mesmo que haja previsão legal acerca da respectiva supervisão, ocorrendo alguma divergência ou evidências da má utilização dos valores, o caminho correto para questionar é valendo-se da ação revisional ou da ação própria para a modificação da guarda ou suspensão do poder familiar. Tal entendimento fora fixado pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no qual havia negado o pedido de um genitor, que para analisar o uso da pensão paga a filha menor, valeu-se da prestação de contas em face de sua ex-mulher.

Consoante o STJ, caso haja deficiências na administração da pensão, esta deve ser objeto de análise global na via judicial adequada, em que haja uma ampla instrução probatória, não obstante, tal procedimento é incompatível com o rito do processo de contas. Ou seja, problemas acerca da má administração das verbas alimentares não são solucionados mediante prestações de contas, especificamente porque os alimentos prestados para garantir o bem-estar da prole não se caracterizam como relação de natureza mercantil ou de gestão de coisa alheia.

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Nesse contexto, a ação de exigir contas não é cabível, pois inexiste relação jurídica material entre as partes, ou seja, a ação de exigir contas é adequada nas hipóteses em que se evidenciam uma relação jurídica material entre as partes, em que o titular do direito de exigir contas pode ter uma sentença favorável, constituindo o título executivo judicial, sendo passível de execução.

Conclusão

Doravante o exposto, não cabe ao alimentante ingressar com a ação de exigir prestação de contas da representante do alimentado, uma vez que entre ambos não há relação jurídica de direito material apta de gerar obrigação, inexistindo tal direito.  

Porventura, acreditando o genitor, que presta alimentos, que os valores pagos estão não estão sendo destinados ao melhor interesse do alimentado deve ingressar com ação revisional de alimentos ou tentar obter a guarda deste.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARLOS ROBERTO, Gonçalves. Direito Civil I. Parte Geral – Obrigações – Contratos (Parte Geral) Esquematizado. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Procedimentos Especiais –  vol. II  – 50ª  ed. rev., Rio de Janeiro: Forense, 2016.

BRASIL. Direito Civil. Lei N o 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 08 de fevereiro de 2020.

Sobre o autor
Diego Rodrigues de Barros

Formado em Direito e pós-graduação em Direito Civil.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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