Princípio da consunção aplicado aos crimes ambientais

05/03/2024 às 17:30
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O princípio da consunção é cabível quando há uma sucessão de condutas com existência de um nexo de dependência, no qual exsurge a ausência de desígnios autônomos, e há uma relação de todo e parte, de inteiro e fração.

Tal princípio pressupõe a existência de um crime-meio para a execução do crime-fim, sendo que a proteção de bens jurídicos diversos e a absorção de crime mais grave pelo de menor gravidade não impede a absorção.

O que se deve perquirir para aplicação do princípio da consunção não é a existência ou não de desígnios autônomos entre os delitos, mas se uma conduta tipificada representar mero exaurimento da outra, sem potencialidade lesiva remanescente.

Isto é, admite-se que um crime de maior gravidade, assim considerado pela pena abstratamente cominada, possa ser absorvido, por força do princípio da consunção, por crime menos grave, quando utilizado como mero instrumento para consecução deste último, sem mais potencialidade lesiva.

Não há obstáculo para a aplicação do princípio da consunção quando restar confirmado que um crime foi utilizado como instrumento para a prática de outro, repita-se, mesmo que os crimes tutelem bens jurídicos diferentes.

Princípio da consunção aplicado nos crimes ambientais

Em suma, o princípio da consunção ocorre quando uma norma penal constitui meio necessário ou uma fase de preparação ou de execução de uma outra infração penal, de modo que exista dependência ou subordinação entre as condutas, como é o caso dos tipos penais em análise.

O entendimento no que tange a impossibilidade de aplicação do princípio da consunção do crime mais grave em relação a crime mais brando é matéria superada, tendo em vista que o STJ, ao apreciar o REsp 1378053/PR, submetido ao rito dos recursos repetitivos (tema n. 933), entendeu que o crime mais grave pode ser absorvido pelo menos grave, quando aquele for etapa preparatória ou executória deste.

Exemplo de aplicação do princípio da consunção

A título de exemplo, aplica-se o princípio da consunção para que os crimes ambientais de destruição/danificação da vegetação nativa (art. 38), causar dano ambiental em unidade de conservação (art. 40) e impedir sua regeneração (art. 48) previstos da Lei de Crimes Ambientais são absorvidos pelo crime de construir casa ou outra edificação em solo não edificável (art. 64 da mesma Lei).

A conduta de construir casa ou qualquer outro tipo de edificação em área de estação ecológica, unidade de conservação do tipo de proteção integral, área de preservação permanente, corresponde unicamente ao crime ambiental previsto no art. 64, pois não há distinção entre os bens jurídicos tutelados pelas normas incriminadoras e o intento do agente é construir casa ou outra edificação em solo não edificável.

Quanto ao crime ambiental de impedir a regeneração de florestas previsto no art. 48 da Lei 9.605/98, a jurisprudência já sacramentou que tal conduta é mero pós-fato impunível do ato de construir em local não edificável.

Tal assertiva decorre porque, com a própria existência da construção desejada e executada pelo infrator, na qual reside o dolo, a regeneração da flora antes existente no mesmo lugar fica inevitavelmente impedida.

Ou seja, se é a própria existência da edificação irregular que impede a regeneração natural da vegetação, o delito do artigo 48 da Lei 9.605/1998 resta absorvido pelo do artigo 64 da mesma legislação.

Absorção ou consunção no crime de causar unidade de conservação

No caso do crime ambiental de causar danos em unidade de conservação (art. 40), consistente na construção de imóvel em local não edificável (art. 64), também se aplica o princípio da consunção, de modo que aquele é absorvido por este.

Sendo assim, para avaliar a possibilidade de absorção de um crime por outro, necessário verificar se o delito menor se encontra na cadeia causal do delito continente, como uma etapa do iter criminis – seja na preparação, consumação ou exaurimento do crime maior.

Outra hipótese é no caso do tipo penal do art. 51 (utilização de motosserra em florestas ou demais formas de vegetação sem licença) da Lei 9.605/98, o qual configura conduta precedente necessária à concretização do tipo do art. 40 (dano a unidades de conservação e áreas de proteção ambiental) do mesmo diploma, quando o dano ambiental for promovido mediante o uso de motosserra, autorizando a incidência do princípio da consunção ou absorção.

No caso, é evidente que a utilização de motosserra é meio para a execução da conduta de danificar, direta ou indiretamente, áreas protegidas, haja vista que o dano em questão foi promovido mediante o uso desse equipamento.

Conclusão

Não há, portanto, concurso formal de crimes, mas conflito aparente de normas, o qual deve ser resolvido com a aplicação do princípio da consunção, ou absorção, conforme obra anterior citada sobre o tema.

Portanto, o princípio da consunção é reconhecido quando uma norma penal incriminadora constitui meio necessário ou uma normal fase de preparação ou de execução de outro crime, caracterizando-se entre as condutas a dependência ou subordinação.

Assim, a tutela de bens jurídicos diversos entre os delitos, a maior gravidade do crime-meio ou a ocorrência de diferentes momentos consumativos entre o crime-meio e o crime-fim não são impeditivos para que incida a consunção.

Fonte: https://advambiental.com.br/artigo/principio-da-consuncao-aplicado-aos-crimes-ambientais/

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Sobre o autor
Cláudio Farenzena

Escritório de Advocacia especializado e com atuação exclusiva em Direito Ambiental, nas esferas administrativa, cível e penal. Telefone e Whatsapp Business +55 (48) 3211-8488. E-mail: [email protected].

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