Órgãos da jurisdição brasileira

Lucia Cristina Florentino Pereira da Silva
Evelyn Priscila Santinon Sola
24/03/2023 às 11:59
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Resumo

Jurisdição é a função do Estado, responsável pela decisão de conflitos, que garantem ao cidadão o resguardo de seus direitos, através da instauração de processos. Tem sua garantia na Constituição Federal do Brasil, perpassando por vários níveis de decisão processual, seja da primeira instância até o Supremo Tribunal Federal.

A jurisdição e seus órgãos

A jurisdição pode ser entendida como a concretização do direito, realizada por um terceiro imparcial e é uma das funções exercidas pelo Estado. Tem, como suas características, substitutividade, a exclusividade, a imparcialidade, o monopólio do Estado, a inércia e a unidade (RUSSAR RACHEL, 2009).

Os órgãos jurisdicionais estão atrelados à função do Estado, sendo de competência do Poder Judiciário e tem como função "expressa o encargo que têm os órgãos estatais de promover a pacificação de conflitos interindividuais, mediante a realização do direito justo e através do processo" (Cintra, Grinover e Dinamarco, 2010).

Como regra geral, comumente os processos têm seu início na primeira instância, podendo ser levados, por meio de recursos, para a segunda instância, para o Superior Tribunal de Justiça – STJ, outros tribunais superiores, podendo inclusive chegar ao Supremo Tribunal Federal (STF), responsável pela finalização das questões judiciais no Brasil, quando constitucionais.

Órgãos jurisdicionais

Relacionados como órgãos integrantes do poder judiciário, o art. 92 da Constituição Federal descreve cada um de, sendo deles: Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunais Regionais e Juízes Federais, Tribunais e Juízes do Trabalho, Tribunais e Juízes Eleitorais, Tribunais e Juízes Militares, Tribunais e Juízes dos Estados e do distrito federal e Territórios. São distribuídos através desses diversos órgãos da jurisdição estatal brasileira, não podendo ser exercida por outra pessoa ou organismo, sob pena de infração a garantia do princípio constitucional do juiz natural.

Ainda, existindo órgãos que não possuem competência jurisdicional, mas são órgãos judiciários, sendo o Conselho Nacional de Justiça (art. 92, I-A e EC n. 45), Ouvidorias de Justiça, Escolas da Magistratura. Onde esses órgãos judiciários, exerce a função exclusivamente administrativa, cabendo-lhes atividades relacionadas com a autonomia do Poder Judiciário, sua organização, condutas dos juízes, etc., conforme a Constituição Federal/88, art. 103-B, §4ª e seus incisos (DINAMARCO, 2017).

A jurisdição internacional do juiz brasileiro

O Novo Código de Processo Civil, mais precisamente nos art. 21 ao 23, tratam das questões relativas as jurisdições dos juízes brasileiros, em face de tribunais estrangeiros. Existindo a jurisdição internacional exclusiva e a jurisdição internacional concorrente. (SCARPINELLA BUENO, 2016)

No caso, a jurisdição internacional exclusiva pelo que dispõe o art. 23, do Código de Processo Civil, o juiz brasileiro terá a jurisdição exclusivamente para: (a) conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil; (b) em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento particular e ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicilio fora do território nacional; (c) em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicilio fora do território nacional. Nesses casos, a ordem justiça brasileira exclui a eficácia das sentenças proferida no estrangeiro, não produzindo efeito, inclusive, para uma homologação no STJ (DINAMARCO, 2017).

Nos termos do art. 21, onde a jurisdição internacional será concorrente, confere-se o processamento e o julgamento da demanda quando o réu, qualquer que seja sua nacionalidade, estiver domiciliado no território brasileiro; quando se convencionar que a obrigação pactuada no plano material deverá ser cumprida no Brasil e, por fim, quando o fundamento da causa de pedir seja fato ocorrido ou ato praticado- ou que se lhe exija o cumprimento- no Brasil.

E por fim, o art. 22 descreve ainda a jurisdição internacional concorrente, onde à autoridade judiciária brasileira processar-se-á e julgará as ações decorrentes de relações de consumo, quando o consumidor tiver domicilio ou residência no Brasil; nas ações em que as partes, expressamente ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional; e ainda, nas ações de alimentos, quando: (a) o credor tiver domicilio ou residência no território nacional; (b) o réu mantiver vinculo no Brasil, tais como posse ou propriedade de bens, recebimentos de renda ou obtenção de benefícios econômicos. (THEODORO, 2016)

Organização judiciária

O Novo Código de Processo Civil viabiliza uma interpretação e uma aplicação mais harmônicas com as linhas fundamentais traçadas com os valores do Estado constitucional brasileiro. A Constituição Federal determina os institutos característicos do desenvolvimento do processo, fixa a estrutura dos órgãos jurisdicionais, garantindo a distribuição da justiça, estabelece regras como os princípios constitucionais processuais e assegura a todos o acesso à Justiça. (SCARPINELLA BUENO, 2016)

Não é por acaso que a Constituição Federal de 1988 inseriu em seu contexto regras processuais. Como o aspecto político, onde as normas constitucionais dispõem a organização judiciaria brasileira representado pelo Judiciário como um Poder entre os Poderes do Estado, de forma autônoma e harmoniosa convive com o Poder Legislativo e Poder Executivo. O relevo da garantia judicial no corpo de uma Constituição, além de político e ideológico, desborda para o caráter jurídico, devido à rigidez que a Constituição impõe à modificação de seu texto, trazendo uma estabilidade de normas (DINAMARCO, 2017).

Ainda, se faz presente, nas normas constitucionais um rol de princípios processuais, já delimitando de forma sabiamente as garantias jurisdicionais para a sociedade. Com os delineamentos da atividade processual, princípios e institutos que irão reger essa atividade, inseridos no texto constitucional, têm o Direito Processual Constitucional, com caráter de fundamentalidade na disciplina do processo.

Uma característica marcante da influência constitucional sobre o processo é o fato de a Carta Maior instituir o Poder Judiciário e sua autonomia, a estrutura judiciária, a composição dos juízos em todos os graus de jurisdição, criando órgãos jurisdicionais e assegurando o regime da Magistratura e períodos de trabalho forense, questões estas fundamentais para o exercício da jurisdição.

As garantias institucionais do Poder Judiciário

O Poder judiciário, sendo um órgão que tem independência dos demais Poderes do Estado, a ordem constitucional lhe oferece garantias. No plano das garantias ao Poder Judiciário a Constituição Federal lhe assegura seu autogoverno e sua autonomia administrativa e financeira (DINAMARCO, 2017).

Quanto à autonomia administrativa, esta se manifesta pela estruturação e funcionamento dos órgãos do judiciário. Dessa maneira, conforme art. 96 da Constituição, aos tribunais compete: (a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, observando as normas de processo e as garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos; (b) organizar suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízos a eles vinculados, velando pelo exercício da atividade correcional respectiva; (c) prover, na forma prevista nesta Constituição, os cargos de juiz de carreira da respectiva jurisdição; (d) propor a criação de novas varas judiciárias; (e) prover, por concurso público de provas, ou de provas e títulos, os cargos necessários à administração da Justiça, exceto os de confiança assim definidos em lei; (f) conceder licença, férias e outros afastamentos a seus membros e aos juízes e servidores que lhes forem imediatamente vinculados (SCARPINELLA BUENO, 2016).

Quanto à autonomia financeira, conforme dispõem os §§ 1º e 2º do art. 99 da Constituição, compete também aos tribunais elaborar suas propostas orçamentárias dentro dos limites estipulados na Lei de Diretrizes Orçamentárias, conjuntamente com os demais poderes (SCARPINELLA BUENO, 2016).

As garantias individuais dos juízes - os impedimentos

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A Constituição visando assegurar a independência e a imparcialidade dos juízes, no art. 95 CF/88 tratam das garantias que os juízes gozam, sendo essas a clássica garantia tríplice, da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos (DINAMARCO, 2017).

A garantia da vitaliciedade significa dizer que após dois anos de exercício, o juiz só poderá perder seu cargo por decisão tomada em processo jurisdicional ou quando atingida a idade-limite de setenta e cinco anos (SCARPINELLA BUENO, 2016).

A inamovibilidade é garantia dada ao juiz fixada pelo inciso II do art. 95 da Constituição. A inamovibilidade traduz-se na impossibilidade de que o magistrado seja removido, sem o seu consentimento, de uma comarca para outra, ou ainda para outro local, sede, cargo, tribunal, câmara ou grau de jurisdição. Essa regra, porém, não é absoluta. O art. 93, VIII, determina que o ato de remoção do magistrado por interesse público, ou seja, independentemente de sua vontade, poderá ocorrer fundado em decisão por voto da maioria absoluta do respectivo tribunal ou do Conselho Nacional de Justiça, assegurada ampla defesa. (SCARPINELLA BUENO, 2016)

A irredutibilidade de subsídios é garantia disposta no art. 95, III, da Constituição. Ela determina que o subsídio dos magistrados não possa ser reduzido, de forma a assegurar-lhes o livre exercício de suas atribuições (THEODORO, 2016).

Para completar, o sistema de garantias, e para manter a imparcialidade do judiciário, a constituição Federal em seu art. 95, parágrafo único, descreve quais atos são vedados aos juízes no exercício de suas funções, senão vejamos:

(a) exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério;

(b) receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processos;

(c) dedicar-se à atividade político-partidária;

(d) receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei;

(e) exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração.

Com isso o legislador procura garantir que a prestação jurisdicional seja sempre feita em consonância com a estrita legalidade e imparcialidade, devendo, entretanto, a autoridade e a independência dos juízes serem submissos ao regime de responsabilidade pelos abusos e desvios de suas funções. Ainda, o novo diploma prevê casos que o descumprimento do regime de responsabilidade, o juiz deverá reparar o dano causados injustamente as partes, conforme art. 143 do CPC (THEODORO, 2016).

Conclusão

Os órgãos jurisdicionais, aqui descritos sumariamente, tem seu amparo no artigo 2º da Constituição Federal do Brasil, com sua competência distribuída entre seus diferentes escalões, caracterizando o Judiciário como um dos poderes do Estado, garantindo aos cidadãos a aplicação das leis na resolução de conflitos e exercício de seus direitos dos cidadãos.

Bibliografia

AASP. Código de Processo Civil. Anotado. OAB/Paraná. Atualizado em

21/03/2016. ISBN 978-85-86893-00-1.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro

de 1988. 4. ed.

BRASIL. Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9307.htm. Acessado em: 13/06/2017

CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido

Rangel. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 2010. MARINONI, Luiz 

DINAMARCO, Cândido Rangel. LOPES, Bruno Vasconcelos C. Teoria geral

do novo processo civil. 2ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2017.

GRINOVER, Ada P. Teoria Geral do Processo. 28ª edição. São Paulo:

Malheiro,2012. Capítulo1.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 4ª

ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012. p. 11.

RUSSAR, Andrea. O que é a jurisdição e quais são suas características? Jus Brasil.

Disponível em: https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/203261/o-que-e-a-jurisdicao-e-

quais-sao-suas-caracteristicas-andrea-russar.Acesso em: 23 mar 2023.

SCARPINELLA BUENO, Cassio. Novo Código de processo civil anotado. São Paulo,

Saraiva, 2016. 1014 p.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Novo Código de Processo Civil anotado. 2016. 341 p.

Sobre as autoras
Lucia Cristina Florentino Pereira da Silva

Docente da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo- USP. Mestrado e Doutorado pela Universidade de São Paulo.

Evelyn Priscila Santinon Sola

Advogada. Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo USP. Mestre em Direito pela UNISANTOS MBA em Comércio Internacional pela Universidade de São Paulo USP. Máster Management Stratégigue et Génie des Organisations - CAEE Internacional Manager pela Universidade em Grenoble França. Pós-graduada em Educação a Distância: Planejamento Implantação e Gestão. Docente de Direito da Universidade Anhanguera – Sorocaba/SP.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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