A infidelidade conjugal e o dever de indenizar e o pacto antenupcial e contrato de convivência com clausula de infidelidade

08/02/2023 às 20:21
Leia nesta página:

A infidelidade conjugal, embora constitua violação dos deveres do casamento, não gera o dever de indenização por danos morais por si só.

O entendimento do judiciário é que para gerar dano moral, a infidelidade deverá ser acompanhada de dolo de constrangimentos e humilhações públicas.

Vejamos dois casos exemplificativos:

O primeiro o judiciário entendeu que houve humilhação pública. O infiel mantinha publicamente relação amorosa com parente da esposa, inclusive com casos de indiscrições na empresa da família.

“Funda-se a pretensão indenizatória formulada na inicial na descoberta pela agravada que o agravante mantinha há bastante tempo relacionamento extraconjugal com sua afilhada de 24 anos de idade, funcionária da empresa do casal, sendo o fato já de conhecimento e objeto de comentários por parte de outros empregados, amigos e até mesmo dentro da comunidade religiosa frequentada pela família, situação que obviamente expôs à agravada ao escárnio e julgamento por parte de pessoas de seu círculo íntimo.

(...)

consignou expressamente que, em decorrência da ampla dispersão dos relatos de infidelidade do agravante, inclusive com práticas sexuais no estabelecimento comercial da família da autora, essa “sofrera humilhações e constrangimentos em seu círculo íntimo, danos morais que realmente devem ser indenizados ”

PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. RAZÕES QUE NÃO ENFRENTAM O FUNDAMENTO DA DECISÃO AGRAVADA. AÇÃO DE DIVÓRCIO E INDENIZATÓRIA. INFIDELIDADE COMPROVADA. HUMILHAÇÕES E CONSTRANGIMENTOS PÚBLICOS. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR. R$ 30.000,00. ALTERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. 1. As razões do agravo interno não enfrentam adequadamente o fundamento da decisão agravada. 2. Admite a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, excepcionalmente, em recurso especial, reexaminar o valor fixado a título de indenização por danos morais, quando ínfimo ou exagerado. Hipótese, todavia, em que o valor foi estabelecido na instância ordinária, atendendo às circunstâncias de fato da causa, de forma condizente com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 1673702 SP 2020/0051590-6, Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 14/09/2020, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/09/2020)

Neste caso verifica-se que o infiel fez mais que meramente ter uma relação extraconjugal. De fato, ele desrespeitou a figura da esposa em todos os ambientes que ambos frequentavam.

Nesta situação, foi entendido que houve efetivo dano moral, e, por consequência, dever de indenizar.

Passamos a análise do segundo caso, embora fosse admitido a infidelidade conjugal, não houve exposição vexatória ou humilhações públicas.

"RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. Alegação de adultério. Adultério que, por si só, não gera o dever de indenizar. Ausência de circunstâncias extraordinárias que caracterizem o dano moral. Precedentes jurisprudenciais. Agressões físicas ou verbais não comprovadas. Ratificação dos fundamentos da sentença (artigo 252 do RITJSP). Sentença de improcedência mantida. RECURSO DESPROVIDO." (Apelação nº 4000585-09.2013.8.26.0590, Des. Rei. Alexandre Marcondes, data de julgamento: 03/09/2015, 3 a Câmara de Direito Privado TJSP)

Portanto, podemos concluir que o adultério NÃO enseja dever de indenizar, por mais que a situação vivenciada tenha sido sofrida.

O que irá configurar o dano moral é a caracterização do dolo, desconsideração e humilhação pública. Será dano moral indenizável quando o infiel utiliza do adultério para diminuir publicamente a figura da pessoa traída.

Por outro lado, muito se fala do pacto antenupcial com cláusula de infidelidade conjugal.

Pacto antenupcial é um documento, efetivado por escritura pública, que os noivos, antes do casamento, resolvem questões patrimoniais, isto é, regime de bens, descrição dos bens particulares, gravação de bens incomunicáveis (que não serão partilhados), como se dará a administração dos bens particulares, entre outros.

Recentemente, contudo, os noivos buscam incluir a cláusula indenizatória por infidelidade. Nesta cláusula fica convencionado que, em caso de traição conjugal, o infiel deverá indenizar o traído.

Ocorre que, tal clausula não era posta nos pactos pelo costume brasileiro. Todavia, nunca houve legislação proibitiva direta. Havendo, contudo, construções hermenêuticas, tanto para inviabilizar, quanto para viabilizar a possibilidade da clausula.

Todavia, verifica-se o enunciado 635, da VIII Jornada de Direito Civil, do Conselho Federal de Justiça:

O pacto antenupcial e o contrato de convivência podem conter cláusulas existenciais, desde que estas não violem os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar.

Ora, se é entendimento jurídico que pode correr pacto relacionadas a existência, o viver do casal, pode-se ter pactuação sobre a infidelidade.

Neste escopo, com as mudanças na sociedade, os noivos passaram, cada vez mais, solicitar a inclusão da cláusula nos pactos antenupciais e nos contratos de convivência (Escrituras de União Estável).

Justicia, a inteligência artificial do Jus Faça uma pergunta sobre este conteúdo:

Porém, os tabelionatos, e até mesmo o judiciário, possuem resistências para a inclusão da cláusula na escrituras.

Acaso a resistência seja do tabelião, haverá duas alternativas: 1) procurar outros tabelionatos (caso exista na comarca), 2) suscitar a DÚVIDA, nos moldes do art. 198 da Lei de Registros Públicos.

Recentemente, a Justiça de Minas Gerais autorizou a inclusão de cláusula de multa no pacto antenupcial. A decisão poderá diminuir a resistência dos tabelionatos à redação da cláusula, tornando cada vez mais comum a sua utilização.

Se houver pacto antenupcial, ou o contrato de convivência, com cláusula indenizatória , a infidelidade NÃO precisará ser pública para ser indenizada. Bastará apenas a prova da infidelidade.

Sempre é bom lembrar: O contrato de convivência ou o pacto antenupcial devem ser feitos por escritura pública para terem validade. Mas, se você quiser incluir cláusulas, como a da infidelidade, ou personalizar o documento, para que realmente os desejos do casal: Procure um advogado.

Sobre a autora
Eunice de Araújo Gomes

www.adveunicegomes.com.br Graduada em Direito pela PUC/RS no ano de 2011. Trabalhou como advogada autônoma em escritórios de advocacia de Porto Alegre. Atualmente, advogada autônoma. Em andamento: Especialização de Direito de Família e Sucessões - PUCRS. Graduada em Enfermagem pela PUC/RS no ano de 2002. Foi residente do programa de Residência Multidisciplinar da Escola de Saúde Pública na área temática de Saúde Coletiva. Trabalhou, como Enfermeira, em hospitais de Porto Alegre e Região Metropolitana nas áreas de UTI e Pós Operatório.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos